O REAL À PROCURA DO TEATRO

"Não imaginava que eu, que tinha o meu negócio, tinha a minha casa, vim de férias a Portugal e fiquei na rua, sozinha. Mas também foi uma experiência para mim."

Haj Sumai, 58 anos

DESCOBRIR ALEXANDER ZELDIN

 

A escrita de Alexander Zeldin (1985) procura expôr as histórias que se escondem por detrás da máscara do quotidiano. "O teatro é uma forma de me ajudar e às pessoas com quem estou a ter uma melhor compreensão sobre nós mesmos e sobre o nosso lugar no mundo.", revela a certo ponto ao The Guardian. No seu trabalho Zeldin chega a envolver pessoas que estão a viver as realidades relatadas nas suas narrativas. Para o encenador, o teatro não é um lugar de faz-de-conta mas um espaço para que as pessoas possam sentir a vida "com a intensidade própria do seu caráter verdadeiro, trágico e milagroso". Assim, grande parte das suas peças são apresentadas em tempo real e com as luzes acesas.

Em 2016, Zeldin desenvolveu LOVE, uma história sobre uma série de famílias reunidas enquanto viviam em acomodações temporárias no período que antecede o Natal e sobre questões como a doença mental, o desemprego e de como, de um momento para o outro, podemos perder tudo ou dar a volta. Também nós olhámos as pessoas reais do nosso contexto. FOR REAL é o capítulo dedicado a três vozes que já viveram na rua e conseguiram sair dela. Para ouvir n'O Projeto Invísivel, a revista sonora da Culturgest.

"A rua é uma volta de 360 graus. Quem esteve bem, quem está mal. Como é que acontece? Começamos por desenrascar uma noite. Esperamos que chegue a manhã. Vive-se uma noite de cada vez, um dia de cada vez. E estamos na luta."

Marco Monteiro, 46 anos

LIBERDADE

Sérgio Godinho
Viemos com o peso do passado e da semente 
Esperar tantos anos torna tudo mais urgente 
e a sede de uma espera só se estanca na torrente 
e a sede de uma espera só se estanca na torrente 
Vivemos tantos anos a falar pela calada 
Só se pode querer tudo quando não se teve nada 
Só quer a vida cheia quem teve a vida parada 
Só quer a vida cheia quem teve a vida parada 
Só há liberdade a sério quando houver 
A paz, o pão 
habitação 
saúde, educação 
Só há liberdade a sério quando houver 
Liberdade de mudar e decidir 
quando pertencer ao povo o que o povo produzir 
quando pertencer ao povo o que o povo produzir
 

"A nossa filosofia passa por dar acesso à habitação. Todos nós temos direito a uma habitação e nós partimos desse princípio que é o primeiro passo é esse e depois tudo o resto é tratado a seguir com o acompanhamento da equipa, desde a ligação aos serviços da comunidade, à integração na vizinhança."


Cátia Faísca, Associação Crescer

O que é que muda quando as pessoas têm uma casa?

"Diria que muda tudo. desde a forma como pessoa se sente, à forma de estar, muda muita coisa mesmo. os focos e os objetivos mudam, ganham rumo. É uma pergunta muito difícil porque muda tudo, nós às vezes vemos mudanças tão pequeninas e para nós é tão comum, a questão da higiene, que para nós é essencial, todos os dias tomamos banho, para algumas pessoas entrar numa casa significa poderem fazer a sua higiene, à vontade, com segurança. Às vezes, uma noite bem dormida, o sentir que estão seguros."


Cátia Faísca, Associação Crescer

"Isto para mim é o meu templo, é o meu espaço. Agora tenho mais paz de espírito, já não estou naquele stress diário do acordar. Ajudou-me a melhorar a mim mesmo, como pessoa também. a cuidar mais de mim. Tenho esperança, já passei por tanto. podia morrer hoje que morria feliz."

José Luís Rodrigues, 48 anos

FICHA TÉCNICA

ENTREVISTADOS Marco, José, Sumaj na sua casa e Cátia Faísca, da Associação Crescer

ENTREVISTAS REALIZADAS POR Maria João Caetano

AGRADECIMENTOS
Associação Crescer

FOTOGRAFIA
Bruno Castro

DESIGN E WEBSITE
Studio Maria João Macedo & Queo

COFINANCIADO PELO PROGRAMA EUROPA CRIATIVA DA UNIÃO EUROPEIA NO ÂMBITO DO PROJETO ACT – ART, CLIMATE, TRANSITION