A COR TOMA-ME
Ângelo de Sousa

A sua descoberta da pintura tinha sido, como Klee relatava: "A cor toma-me".

Ângelo de Sousa foi um dos protagonistas da contemporaneidade artística portuguesa. Dividiu-se intensamente entre a arte - a pintura e a escultura -, a investigação e a docência. Nascido em Moçambique, adoptou o Porto para viver desde os 17 anos e manteve-se sempre inquieto com incursões na área da escultura, fotografia, cinema e gravura.

Árvores

Começou a desenhar figuras que se assemelhavam a árvores em 1958, teria vinte anos. Fê-los toda a vida, de forma mais ou menos constante, mais ou menos intensa, e chegou a referir numa entrevista que foram as primeiras peças relevantes que fez enquanto artista. Chamava-lhes “árvores” – não como quem dá um nome, mas como quem põe uma alcunha.
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
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Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa, Árvores
©Bruno Lopes
Ângelo de Sousa começou a desenhar figuras que se assemelhavam a árvores em 1958, teria vinte anos. Fê-los toda a vida, de forma mais ou menos constante, mais ou menos intensa, e chegou a referir numa entrevista que foram as primeiras peças relevantes que fez enquanto artista. Chamava-lhes árvores – não como quem dá um nome, mas como quem põe uma alcunha*.  Ou seja, chamava-lhes “árvores” em vez de lhes chamar árvores. Esta diferença – praticamente inaferível no discurso oral – traz consigo todo um programa. Ao invés de buscar o reduto arquetípico de uma árvore – a sua essência, o denominador comum a todas as árvores – o que parece ter interessado Ângelo de Sousa foi precisamente o contrário: explorar as margens do território formal daquilo que pode ser uma árvore: testar os limites dessa relação entre ela e um conjunto de formas que a “fazem lembrar”, perceber quão longe poderia ir sem perder esse elo invisível entre um registo e uma ideia. 

Bruno Marchand 
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O que faz de um nome uma alcunha é o seu caráter metonímico, a capacidade que ela tem de sugerir que uma parte da coisa pode servir para significar a coisa toda. Trata-se, portanto, de uma estratégia de redução, e a redução foi algo pelo qual Ângelo de Sousa pugnou durante todo o seu percurso. Como o próprio tão contundentemente afirmou, interessava-lhe "o máximo de efeitos com o mínimo de recursos, o máximo de eficácia com o mínimo de esforço, e o máximo de presença com o mínimo de gritos”. Os desenhos que se apresentam nesta exposição são testemunho do encontro entre estes dois impulsos, metonímico e minimal. Do impulso minimal chegam-nos a tendência para a economia de meios e para a objetividade representativa – para o desenho se cingir à apresentação de um corpo uno, isolado, livre de adornos ou de articulações com outros elementos. Do impulso metonímico ficam as inúmeras aproximações ao que uma “árvore” pode ser, todas as variações de uma série que se desenvolve como uma força centrífuga ao invés de centrípeta.

Explorar as margens é uma forma de celebrar a diversidade. É também um modo de afirmar que não se procura – talvez mesmo, que não se acredita n’ – a versão essencialista das coisas. As margens são, claro, zonas de contacto, de miscigenação, de fluidez e de possibilidade. São espaços onde temos necessariamente de negociar os limites da nossa própria porosidade, do quanto estamos disponíveis para rever as fronteiras das nossas categorias. As obras selecionadas para esta exposição permitem acompanhar esse movimento que Ângelo de Sousa descreveu entre as árvores do final dos anos 1950 – virtuosas representações desse elemento vegetal, algumas delas bastante detalhadas – e as “árvores” da viragem do século – massas grumosas, como raízes nodulares ou como tubérculos que se verticalizam na altura da página A5, modelados de forma irreal pela ponta angulosa de uma caneta flomaster. Pelo meio, um ror de declinações, variações e alternativas que, juntas, prefiguram o grande mapa da potência da “árvore” aos olhos do artista.

Não é figura de retórica: Ângelo de Sousa via, efetivamente, “árvores” quando olhava para o papel. Dos milhares de desenhos que fez dentro desta temática, apenas guardou aqueles que lhe pareciam “funcionar”. Destes, alguns viriam a servir-lhe como base para desenhos maiores ou mesmo para pinturas; outros ficariam como registo dessa cartografia marginal que ia ensaiando a cada nova sessão. Todos, sem exceção, são fruto de um modo de fazer que, para “funcionar”, precisava de obrigar a mão a seguir o que a imaginação via pairar, como um fantasma, na superfície da folha. Sem desvios, sem divagações. “Quando não a seguia, não ficava bem”. 

Quando a seguia, concretizava uma espécie de suspensão da intencionalidade artística. Faz lembrar outra expressão complicada, esta da autoria de Marcel Duchamp: “coeficiente artístico”. Para o artista francês, o coeficiente artístico era a diferença entre aquilo que o artista quis fazer e o que ele efetivamente fez – esse “quê” que escapa ao controle do autor, mas que não deixa de ser da sua responsabilidade. Não se trata do acaso, nem do acidente – trata-se do deslizamento do gesto que se programou acontecer assim, mas que acabou por acontecer assado. Seguir uma forma que se vê pairar sobre a folha, suspender toda intromissão da vontade, da licenciosidade artística, é algo só possível por intermédio de um duplo treino: do treino da mão para seguir a imaginação e desta para inventar a forma certa. Os desenhos que aqui apresentamos são fruto desse exercício que Ângelo de Sousa fez toda a vida; dessa constante busca pela capacidade de tornar o coeficiente artístico igual a zero. 
 

* - Todas as citações neste texto são retiradas da entrevista a Ângelo de Sousa conduzida por Nuno Faria e incluída no catálogo Transcrições e Orquestrações - desenhos de Ângelo de Sousa, Lisboa: CAM, 2003.

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Entre 1995 e 2017, Jorge Silva Melo cruza a sua dimensão de cronista com a paixão pelo cinema e inicia uma série de retratos que expõem as obras de diversos artistas plásticos. Um deles foi Ângelo de Sousa. Ângelo De Sousa: Tudo O Que Sou Capaz começou a ser rodado em 2007 e estreou em 2010. Segundo o próprio realizador, este é um "retrato de um homem que se quer teimosamente simples, artista que reduziu o seu trabalho às três cores primárias e ao preto e branco, inventando permanentemente novas formas ou alterando as formas em suportes que as dinamizam." Um trabalho em colaboração, tal era a proximidade com o artista.

ÂNGELO DE SOUSA: TUDO O QUE EU SOU CAPAZ de Jorge Silva Melo (2009) – excerto

ÂNGELO DE SOUSA

Lourenço Marques, 1938 – Porto, 2011

Viveu e trabalhou na cidade do Porto desde 1955.

Pintura, fotografia, filme, escultura, desenho e instalação, modelaram o seu discurso artístico, apoiado numa prática que valorizou sempre o caráter experimental. No seu percurso são fundamentais a serialidade, a repetição e a economia de recursos formais conducente à criação de obras  que procuram obter "o máximo de efeitos com o mínimo de recursos, o máximo de eficácia com o mínimo de esforço, e o máximo de presença com o mínimo de gritos”.

Realizou a sua primeira exposição em 1959, na Galeria Divulgação, no Porto, ao lado de Almada Negreiros. Em 1977, é um dos artistas selecionados por Ernesto de Sousa para participar na exposição Alternativa Zero. Em 1993, a Fundação de Serralves organizou uma exposição antológica do seu trabalho de pintura e desenho e, em 2001, do seu trabalho de fotografia e cinema. Em 2008, Ângelo de Sousa representa Portugal na 11ª Exposição Internacional de Arquitetura da Bienal de Veneza, em parceria com Eduardo Souto Moura.

Em 1975, é galardoado com o Prémio Internacional (ex aequo) da 13ª Bienal de São Paulo, em 1986, com o Prémio de Pintura da 3ª Exposição de Artes Plásticas da FCG e, em 2000, recebe o Grande Prémio EDP.

© Ângelo de Sousa. Sem título (auto-retrato), 1986.© Ângelo de Sousa. Sem título (auto-retrato), 1986.
© Ângelo de Sousa. Sem título (auto-retrato), 1986.

REAÇÃO EM CADEIA

Esta exposição é o nono e último momento do ciclo Reação em Cadeia, uma colaboração entre a Fidelidade Arte e a Culturgest, que propôs aos artistas participantes a escolha do artista sucessor. Com curadoria de Delfim Sardo (2019–2020) e Bruno Marchand (2020–2022), o ciclo implicou uma adequação dos projetos expositivos às caraterísticas dos espaços que ocupou, a saber, a Fidelidade Arte, no Chiado, em Lisboa, e a Culturgest, nos Aliados, no Porto.

Por cada ano do ciclo é publicado um livro com extensa documentação dos três projetos apresentados, encontrando-se atualmente disponíveis os dois primeiros volumes.

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O ciclo iniciou-se em 2019 com um programa que, cumprindo com esta lógica de sucessão, contou com a participação dos seguintes artistas:

2019
#1 Ângela Ferreira (Moçambique, 1958)
#2 Jimmie Durham (EUA, 1940 – Alemanha, 2021)
#3 Elisa Strinna (Itália, 1982)

2020
#4 Evan Roth (EUA, 1978)
#5 Alicia Kopf (Espanha, 1982)
#6 Las Palmas (Portugal)

2021
#7 Rodrigo Hernández (México, 1983)
#8 Silvia Bächli (Suíça, 1956)
#9 Ângelo de Sousa (Moçambique, 1938 – Portugal, 2011)

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FICHA TÉCNICA
EXPOSIÇÃO

CURADORIA
Bruno Marchand

ASSISTENTE DE CURADORIA
Sílvia Gomes

COORDENADOR DE PRODUÇÃO
António Sequeira Lopes

PRODUÇÃO
(CULTURGEST PORTO)
Susana Sameiro

ESTAGIÁRIO
João Reis

PREPARAÇÃO DE OBRAS
Isabel Zarazúa
Renato Ferrão

MONTAGEM
Bruno Fonseca
Renato Ferrão

AGRADECIMENTOS
Miguel de Sousa
Joana Caldeira
Carla Garcia
Mário Valente

MICROSITE

EDIÇÃO
Inês Bernardo

REVISÃO DE CONTEÚDOS
Catarina Medina

DESIGN E WEBSITE
Studio Macedo Cannatà & Queo

Com o apoio