Em homenagem à vida e obra de Eduardo Batarda (Coimbra, 1943 – Lisboa, 2025), recentemente falecido, a Coleção da Caixa Geral de Depósitos destaca a obra Sem título (1971). Irónico e profundamente conhecedor da história da pintura, Batarda desenvolveu o seu trabalho ao longo de sete décadas, deixando um legado incontornável na arte contemporânea portuguesa.

Frequentou o curso de Pintura da Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa (ESBAL) entre 1963 e 1968. Durante o serviço militar (1968 - 1971), dedicou-se à ilustração de vários livros, incluindo as pranchas de O Peregrino Blindado, publicado pela Galeria 111. Entre 1971 e 1974, estudou no Royal College of Art, em Londres, com uma bolsa da Fundação Calouste Gulbenkian, tendo sido distinguido com os prémios Sir Alan Lane e John Minton. Neste período, foi fortemente influenciado pela cultura Pop britânica, recorrendo a técnicas e métodos da banda desenhada e da ilustração. As obras iniciais revelam temas fraturantes da sociedade da época — como a guerra, a sexualidade, a política — bem como alusões literárias e comentários à atualidade artística e cultural. No catálogo da exposição Outra vez não. Eduardo Batarda! (Serralves, 2011-2012), o artista comenta com ironia esta série de obras de 1971: “É curiosa a história deste quadro e dos seus parentes que sobreviveram. Reflecte confusão, hesitações e decisões erradas. Foi feito (foram feitos) pouco depois da chegada ao Royal College of Art, a seguir a tentativas (não muitas) de regressar à pintura no ponto em que a tinha largado, a meio de 1968 – com uma injecção ou outra do Peregrino Blindado (1969/70). Não fiquei satisfeito com essas tentativas. (...) Eram, supostamente, versões caricatas de ‘estruturas’ essenciais da superfície pictórica, reforçadas por alusões às próprias estruturas físicas do objecto-quadro. (...) Viria a deixar os quadros para trás, no Royal College (...) para alguém lhes pintar por cima, mas um ‘amigo’ fê-los chegar a Lisboa, onde foram ganhando vida própria, sem que eu, ciente da sua presença, os reconhecesse ou assinasse – até que pensei em mostrá-los na exposição do CAM.”

A obra Sem título (1971), pertencente à Coleção da Caixa Geral de Depósitos, é uma pintura monocromática em vermelho escuro, onde se desenham linhas que compõem subtilmente a imagem de uma tela pouco esticada. A aproximação abstrata é simultaneamente contrariada por uma representação do próprio suporte pictórico. É neste confronto entre forma e conteúdo que a pintura se afirma, edificando um universo politizado e sagaz, em que o humor e o sarcasmo são traços marcantes da sua produção.

Batarda foi professor na Escola Superior de Belas-Artes do Porto (ESBAP) entre 1976 e 2008. Em 1986, recebeu o prémio “telegráfico” Homeostética e, em 2007, o Prémio EDP. Realizaram-se duas retrospetivas dedicadas à sua obra: Pinturas 1965–1998, no Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian (Lisboa, 1998), e Outra vez não, no Museu de Serralves (Porto, 2011).

Hugo Dinis

EDUARDO BATARDA
Sem título
1971
Sem título, 1971
Acrílico sobre tela
117 x 83 cm
Inv. 290991
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