No âmbito do empréstimo da obra Cela 4 - Expectativa (1967) de Malangatana (Matalana, Moçambique, 1936 – Matosinhos, Portugal, 2011), destaca-se uma das suas obras que pertence à Coleção da Caixa Geral de Depósitos. A exposição, com curadoria de Anne Bonnin, intitulada Les Péninsules démarrés, está presente no FRAC MÉCA (Bordéus, França), entre 15 de setembro de 2022 e 23 de fevereiro de 2023.

Ao longo de 5 décadas, desde a primeira exposição (em 1961) até à sua morte (em 2011), o artista desenvolveu uma linguagem artística muito própria que, associada à sua biografia, revelou temáticas politizadas e envoltas nos acontecimentos marcantes da sua vida. Nascido numa família com poucos recursos, frequenta a Escola da Missão Suíça em Matalana, perto de Maputo. Em 1953, muda-se para a capital e começa a trabalhar no Clube de Lourenço Marques, onde conhece o pintor e biólogo Augusto Cabral. Em 1958 frequenta o curso de pintura no Núcleo de Arte, fundado em 1936 pelo pintor português Frederico Ayres. Em 1960, com o apoio mecenático de Pancho Guedes, instala o seu atelier na garagem do célebre arquiteto, dedicando-se exclusivamente à pintura. A sua obra inicial reflete aspetos surrealistas de figuras, mitos e objetos imaginários, onde cores fortes e traços marcantes denotam uma figuração mágica e poderosa. Em 1964 é preso pela polícia política portuguesa por ser acusado de colaborar com a Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), no início da guerra de libertação. Deste modo, a sua obra, que começara a incluir o desenho, compreende a dureza do regime colonial durante os 18 meses que esteve encarcerado.

A pintura Cela 4 – Expectativa (1967) é um reflexo desta fase do seu trabalho. Através da intensidade das cores primárias (amarelo, azul e vermelho), do contorno negro do desenho, dos olhos desmesurados da multidão e dos rostos escultóricos, o artista exprime a ideia de coletivo como tentativa de apaziguar os seus medos individuais. A moldura da pintura é de madeira talhada com figuras e símbolos populares, que atesta uma aproximação ao artesanato e as tradições ancestrais moçambicanas. Em 1971 recebe uma bolsa da Fundação Calouste Gulbenkian para estudar na Sociedade Cooperativa de Gravadores Portugueses em Lisboa. Por esta altura também começa a trabalhar em cerâmica. Já de regresso ao seu país natal volta ao cárcere em 1976 e 1977. Nas primeiras eleições multipartidárias realizadas em 1990, após guerra civil, é eleito deputado pela FRELIMO. Em 1995, é agraciado pelo Presidente da República Portuguesa, Mário Soares, como Grande-Oficial da Ordem do Infante D. Henrique. Em 1997 a Unesco nomeou-o como “Artista pela Paz” e, no mesmo ano, recebeu o Prémio Prince Claus Fund for Culture and Development. A sua vida política tem continuidade em 1998 e 2003 como deputado eleito para a Assembleia Municipal de Maputo. Em 2010 recebeu o título de Doutor Honoris Causa pela Universidade de Évora e foi condecorado pelo governo francês, na Embaixada em Moçambique, como “Comendador das Artes e Letras”.

Hugo Dinis

Malangatana
Cela 4 - Expectativa
1967
Óleo sobre platex
98,5 x 123 cm
Inv. 567551
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